O celular toca na madrugada, Úrsula se remexe,
sonolenta:
– Saco! Quem será, uma hora dessas?
“É o meu quase-futuro-ex-marido...
Ou ex-quase-futuro-marido?... Ah, sei
lá!”
–
O que você quer, Miguel?... Tem ideia de que horas são?
–
Tenho, sim...
–
O que você quer?
–
Quero que você venha ao meu quarto...
–
O quê?
–
Venha, tenho uma surpresinha para você...
–
Enlouqueceu, foi?
–
Sim... Ou não. Mas venha, venha. Aposto que vai gostar!
Úrsula,
enfezada, excitada, bate na porta, no final do corredor.
–
Pode entrar...
De
manhã, a filha estranha o trololó na mesa do café.
–
Ué, que bicho mordeu vocês dois?
–
Fizemos as pazes, Marina.
–
Mas assim, mãe, de uma hora para outra?
–
Foi.
–
Você não gostou, filha?
–
Gostei, claro, pai... Só que...
–
Fizemos as pazes, meu amor. Somos marido e mulher, de novo!
–
Tá bom, mãe...
O
celular toca na madrugada, Úrsula se remexe, sonolenta:
–
Saco! Quem será, uma hora dessas?
–
É o seu maridinho...
Úrsula
bate na porta, no final do corredor.
–
Pode entrar...
De
manhã, tome café, tome trololó.
Os
pombinhos, apaixonados como nunca.
A
adolescente, ainda perplexa.
–
Mãe, o que está acontecendo?
–
Nada, filha. Eu já disse: fizemos as pazes. É só.
–
Mas, anteontem, aquela briga feia, a ameaça de separação...
–
Bobagem, filha. Sabe? coisa de momento...
–
Ah, então, tá!
–
Crianças, quem cochicha...
–
Sabemos, querido: o rabo espicha!
Úrsula
bate na porta, no final do corredor.
–
Pode entrar...
–
Que escuridão, Miguel!
–
Estou aqui, venha...
–
O que você está aprontando?
–
Vou acender a luz... Surpresa!
–
Oh, não! Isso não!
Agora,
verdadeiramente, só Úrsula e Marina em casa.
Miguel
está num hotel, no outro lado da cidade.
–
Mas, mãe!...
–
É melhor assim, meu anjo. Um dia você vai entender.
O
celular toca na madrugada, Úrsula se remexe, sonolenta.
O
telefone não para; não para; não para...
–
Fala, Miguel!
–
Olhe, Úrsula, escute...
–
Uma ova! A gente combinou uma coisa, você desfez o trato.
–
Sim, eu sei, mas acredite, não fiz por mal...
–
Ora, me deixa em paz! Adeus!
No
hotel, o pobre homem no pranto cai quando a mulher desliga;
Já
viciou nas chicotadas dela, no jogo todo, agora como será?...
Impassível,
Úrsula transpõe a porta, no final do corredor:
A
camisola branca, sobre a cama, parece rir, zombar...
Num
ímpeto, Úrsula a faz em frangalhos;
Xinga
o marido, único culpado, de burro, cavalo, jumentão!
A
coisa, o casamento, não teria como não ser para sempre:
Bastava
uma briga feia ali, os quartos separados, uma ligação...
Aí,
o tesão...; sim, ai!, e se novamente faltasse o desejo...
Outra
briga feia acolá, de novo os quartos separados,
Uma
ligação...; maldição!, oh! terrível desfecho:
Onde
diabos Miguel fora arranjar “aquele” inferno de Dante?
Qual
tinha sido o combinado?, qual?, qual camisola?
Não
tinha ele que vestir somente a dela, a vermelha, cor de sangue?
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