Era
uma vez um rapaz, chamava-se João, João tem demais no mundo, é uma loucura, ele
era só mais uma nessa multidão, quem sabe, talvez não.
Um
dia João casou-se com Maria, a das Dores, embora antes tenha namorado outras
três Marias, que também são tantas, nem todas santas.
Tiveram
uma penca de filhos, cinco, três princesas e dois príncipes, o mais novo com um
mês apenas, era uma escadinha que não tinha fim.
Quando
o pequerrucho fez um ano, esperava-se que Maria engravidasse de novo, mas não,
o que ela fez surpreendeu a todos, pois foi, deu no pé.
De
tarde, os filhos dormindo, outros na escola, ela ajeitou uma bolsa, catou algum
dinheiro, e ligou de um orelhão, adeus,
venha para casa, João.
O
marido, sem entender, herdou a criançada toda, pensou que fosse enlouquecer,
sem norte, direção certa, ai, meu Pai, o que eu faço agora?
O
patrão, deveras comovido, dispensou ele uns dias, enquanto João dava um jeito
na vida, quem sabe a Maria não voltava, e tudo se arrumava?
Mas
não, a desnaturada não voltou, nem ali nem na semana seguinte, e João arranjou
uma moça para cuidar da meninada, o pobre estava exausto.
Lurdinha
morava lá embaixo, perto do rio, ótima, dava gosto vê-la em ação, os meninos limpinhos,
de bucho cheio, a casa toda arrumada.
Passava
o dia com as crianças, de noite, quando João do serviço chegava, ela voltava
para casa, morava só com a mãe e um irmão tantã, até amanhã.
Certo
dia, meio a medo, João propôs que ela dormisse no emprego, os filhos gostavam
tanto dela!, seria melhor, você não acha, por que não?
Lurdinha
hesitou um pouco, carecia de falar com a mãe, de manhã ela disse que topava, e
João, agradecido, bem-humorado, reajustou o ordenado.
Ora,
foi uma beleza!, e tanto foi que Lurdinha e João começaram a se engraçar, um
mês depois estavam dormindo juntos, ela logo engravidou...
Justo
quando o menino nasceu, sabe quem foi entrando de repente em casa?, sim, era a
Maria!, foi entrando e escorraçou a moça, abraçou os filhos.
Quando
João chegou do trabalho, foi aquele susto, perguntou cadê Lurdinha?, já sabia a
resposta, Maria no pé do fogão, o cheiro bom da janta.
João
exigiu uma explicação, Maria neca, então ele saiu, correu lá na beira do rio, Lurdinha
podia voltar, vamos, vem, a outra vai embora já!
Lurdinha
voltou, mas a outra, por mais que João pedisse, não arredou pé, e o tempo foi
andando, e as duas foram ficando, olhar, silêncio e ódio.
Até
que um dia, como dissimular?, João mandou a casa aumentar, Lurdinha em um
quarto, Maria no outro, as duas suas esposas, era o jeito...
A
vizinhança não viu aquilo com bons olhos, João um bígamo, um depravado, que
pecado, não tinha ele medo de arder no fogo do inferno?
Mas
João era querido ali por todos, e quando se gosta, o olho finge, e fecha e
cega, de forma que a família foi deixando de causar espantamento.
De
seis, a filharada pulou para oito, mais um de Lurdinha, outro de Maria, e foi
quando João morreu, seu carro caído no córrego, um desastre feio.
Meio
às lágrimas, as mulheres foram obrigadas a trabalhar fora, as duas se revezando
com a gurizada, mas o impacto foi atenuando, a vida segue.
Tempos
depois, o escândalo se espalhou, as duas mulheres estavam juntas, dividiam a
mesma cama, tudo, era o amor surpreendendo a solidão...
Lurdinha
e Maria taparam os ouvidos, falassem à vontade, elas só queriam uma coisa, ser
felizes, felizes para sempre, que louco que não quer?
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