sábado, 30 de outubro de 2010

SONHAR PARA QUÊ?

De manhãzinha, falei à minha esposa do estranho sonho que eu tivera...
“Sonho é besteira, Miguel!”, disse ela com azedume.
Mais tranquilo, fui para o trabalho.
Lá, o João me esperava, aflito:
“Cara, fomos despedidos!”

...

Madrugada.
Bárbara e as crianças dormindo.
Silenciosamente abro a janela, pulo.
Sexto andar.
Uma viatura passa minutos depois e os policiais avistam meu corpo ensanguentado.
O porteiro do prédio, seu Gaspar, é quem faz o reconhecimento:
“Cristo Jesus, é o doutor Miguel!”
(O velho só me chamava assim: o doutor.)
Aí avisam Bárbara; ao me ver, ela entra em desespero; alguém a ampara.
O síndico aparece de roupão amarelo encardido.

...

Não há dúvida – estou morto.
Os moradores, já despertos e excitados pela tragédia, se comprimem ao meu redor na calçada.
Um sussurro:
“Esse Miguel... ou devia muito dinheiro ou tinha câncer ou foi traído pela mulher...”
A frase do meu sonho. A mesma!
Mas tudo é idêntico...
Um sonho, a esposa, a besteira, João, a demissão, a madrugada, a janela, o pulo, os policiais, o porteiro...
Igualzinho!
Exceto por um detalhe: no sonho, eu me chamava... Epidauro.
Eu, hem!
Ninguém merece um nome desses... Ninguém merece!

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