quarta-feira, 12 de outubro de 2011

GUARDA-

        
Guarda-Chuvas
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      Meu gato tem um medo pra lá de esquisito. É avistar um guarda-chuva preto fechado e ele nem liga; mas se o guarda-chuva estiver aberto, meu Deus!, o bichano eriça o pelo e sai correndo em fuga desesperada...
     Criei meu gato desde novinho e, que eu me lembre, aqui em casa ele não teve nenhuma experiência traumática com guarda-chuvas. Então, como explicar esse seu medo absurdo?
         Contei isso pra minha melhor amiga e ela disse:
       “Guarda-chuva preto se parece com morcego, não parece? Vai ver, Leo, o teu gato tem medo de morcegos e acha que guarda-chuva é um morcegão!”
         Achei que Vera estivesse me zoando, mas bem que ela poderia ter razão. Um fim de tarde, levei Rico pro quintal. No céu, competindo com as primeiras estrelas, os morcegos esvoaçavam pra lá e pra cá. Alguns voavam tão baixo que, por pouco, um deles não me acerta a cara...
         Soltei Rico bem no meio do quintal. Foi se ver livre e o danado começou a brincar com os morcegos. Ficava entocado e, quando um incauto se aventurava num voo rasante, ele dava um salto espetacular e quase capturava o bicho, que saía doido rumo às alturas.
         Sorri e voltei pra dentro de casa. Estava no telefone contando pra minha amiga o que acabara de descobrir, quando o gato entrou na sala carregando um morcego na boca. O meu susto foi tão grande que deixei cair o telefone no sofá...
         Vociferei:
“Sai daqui, Rico, leva essa porcaria lá pra fora, já!”
Como se fosse de propósito, o gato soltou o morcego bem na minha frente e, com toda a tranquilidade do mundo, foi na direção da cozinha...
Eu peguei o telefone. Do outro lado, Vera, aflita, perguntava o que estava acontecendo. Eu relatei o ocorrido e damos boas gargalhadas juntos.
Desliguei e corri à cozinha pra pegar a pá de lixo pra recolher o morcego. Rico bebia o leite dele tranquilamente. Brinquei com ele:
“Daqui a pouco vou te mostrar o guarda-chuva pra você pagar o susto que me deu, viu, seu malvadinho?”
Quando voltei à sala, nem sinal do morcego!...
Fui ver atrás do sofá, e mal o puxei, o diacho saiu voando lá de trás e passou raspando na minha orelha, sumindo porta afora...
“Está decidido, pronto!”, pensei. “O Rico vai ter o seu guarda-chuva hoje!”
E, com o coração ainda acelerado, tratei de pôr em prática minha pequena vingança...


-CHUVA

Chego em casa às 9, debaixo duma bruta chuva. Mal entro, meu gato vem se esfregar nas minhas pernas, mas se afasta discretamente ao perceber que estou todo encharcado. O guarda-chuva que minha amiga me emprestara pouco havia adiantado...
Deixo o guarda-chuva na cozinha e vou pro quarto, me trocar; depois, abro a porta do quintal e jogo a roupa molhada dentro dum balde qualquer, ao lado do tanque. Lavarei pela manhã, antes de ir pro trabalho – se der tempo.
Meu gato reaparece. Ponho leite pra ele na tigelinha e esquento comida pra mim. Janto pensando na difícil prova de Matemática de amanhã. Foi por isso que passei duas horas na casa de Vera, estudando. Ela é craque com os números. E é minha melhor amiga também!
O guarda-chuva está ali mesmo, em pé num canto. Meu gato bebe o seu leitinho muitíssimo próximo a ele. Que está fechado, evidentemente. Se estivesse aberto, meu gato já estaria bem longe. Ele tem verdadeiro pavor de guarda-chuva preto aberto. Eu juro por Deus que não consigo entender de onde vem esse seu medo bobo...
Depois de jantar, vou ver televisão. Rico – é este o nome do meu bichano – pula logo no meu colo e fica ronronando.
A chuva finalmente passou. Vejo um pedaço de um programa sobre a vida selvagem na Amazônia e em seguida vou dormir, não sem antes ir à cozinha e abrir o guarda-chuva pra escorrer a água.
Meu gato havia me seguido e, ao ver o guarda-chuva abrindo, desaparece em fuga desesperada... Uma vez Vera me disse que Rico devia ter medo de morcego e, como guarda-chuva preto se parece com morcego, podia achar que fosse um morcegão.
Nada disso. Rico às vezes até brinca com os morcegos lá no quintal, no fim da tarde. Uma vez até capturou um deles – que sem dúvida se afoitara num voo rasante –, e o trouxe pra dentro de casa, o danado.
Me deito sorrindo ao lembrar do meu susto diante do episódio, mas de repente, ao me cobrir com o lençol, penso com profunda tristeza no guarda-chuva; não o que está aberto lá na cozinha, simples guarda-chuvinha inofensivo, mas o outro – de fato assustador! –, que talvez esteja começando a se abrir dentro de mim...

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